A Bíblia fala de uma grande rebelião. Um dos três seres mais poderosos criados por Deus se rebelou contra o Todo-Poderoso. Era um ser cheio de glória (Ez 28.13-19), mas se deixou dominar pela iniquidade e afrontou o Eterno. Quis subir ao monte da congregação, lugar espiritual da Trindade, e ser semelhante ao Altíssimo (Is 14.13-15).
De todas as criaturas de Deus, somente a raça humana tem o privilégio de ser semelhante ao Altíssimo (Gn 1.26). Somente a humanidade tem presença na Trindade: Jesus Cristo, verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem (Ap 22.1). De fato, nenhum anjo jamais ouviu o que foi dito a Jesus Cristo, porque os anjos são seres usados por Deus para abençoar a humanidade (Hb 1.13,14).
Será, então, que esse ser soube disso e se recusou a ser um prestador de serviço para a humanidade, por saber que o ser humano teria a glória que ele (o ser caído) tanto almejava e, por isso, rebelou-se contra o Criador, não aceitando o papel que lhe estava designado no reino de Deus?
Quando o adversário de nossa alma nos atraiu para a sua rebelião (Gn 3.1; Ap 12.9), juntamente com os outros seres que o seguiram (Ap 12.4), não estava tentando construir um reino paralelo ao de Deus, uma vez que nada nem ninguém podem sobreviver sem a permissão e o sustento vital de Deus. Antes, estava tentando provocar o juízo de Deus que destruiria tudo e todos. Era um ato suicida, do tipo: “Já que não posso ter ou ser o que quero, então que ninguém consiga ser ou ter o que deseja”. Esse plano, no entanto, foi frustrado pela presciência de Deus que, antes de dizer: “Haja luz”, disse: “Haja cruz”, sabendo que, se não dissesse a segunda frase, não poderia dizer a primeira (Cf.1Pe 1.18-20).
Por isso, a queda não foi um simples ato da vontade que traria a emancipação da humanidade. A queda foi uma tomada de partido. Uma escolha pela rebelião. Por tudo isso, pecar é mais do que uma falha moral, ou titubeio diante da fraqueza, ou mera quebra da lei. Pecar é tomar partido do rebelde.
A ira de Deus é plenamente justificada (Jo 3.36). A raça humana se uniu à rebelião apoiando, assim, o ato de afronta ao Senhor Deus. Ainda bem que a ira divina foi mediada pelo amor demonstrado na cruz do Calvário.
A proclamação do reino de Deus — uma realidade na qual somente a vontade de Deus é feita (Mt 4.17) — nos adverte o seguinte: toda e qualquer rebelião vai ter fim. Deus não vai mais tolerar a insurreição. E exige, como fruto da oportunidade que nos é concedida, que todos, em todos os lugares, arrependam-se. Isto é, abandonem a rebelião e se submetam ao reinado de Deus. E essa oportunidade é oferecida na história antes que a história tenha fim. A história como a conhecemos.
Evangelizar é levar esse ultimato, que nada mais é do que fruto do amor de Deus, que retardou o juízo e, à custa de si mesmo, providenciou uma possibilidade de arrependimento, de volta, para a humanidade.
Os filhos de Deus são os que, por meio de Jesus Cristo, romperam com a rebelião, voltando, de joelhos, para o Pai, reconhecendo que o Universo é fruto do amor divino e que qualquer coisa fora da vontade de Deus é disfuncional. Por isso, a oração dos filhos de Deus é para que venha o seu reino e só a sua vontade seja feita. E para que o Pai lhes dê força, para que não cedam às pressões do inimigo, para que rejeitem a rebelião (“não nos deixes cair em tentação”) e para que não haja entre eles e o maligno nenhum ponto de contato (“livra-nos do mal”).
A ação salvadora de Cristo, mais do que um ato de libertação, é um ato de reordenação do Universo: repondo as coisas nos seus devidos lugares, segundo os desígnios do Criador, e tendo Cristo como o grande centro orbital de todas as coisas (Ef 1.10).