A primeira coisa que me chocou quando vim morar numa casa com deficientes mentais foi que a sua afeição ou antipatia por mim não tinha, absolutamente, nada a ver com quaisquer das muitas coisas úteis que eu havia feito até então.
Como nenhum deles podia ler meus livros, estes não podiam impressioná-los, e como a maioria deles nunca havia ido à escola, os meus vinte anos em Notre Dame, Yale e Harvard não me proporcionaram uma apresentação especial.
A minha considerável experiência ecumênica provou ter menos validade ainda.
A incapacidade de usar quaisquer das habilidades que me foram tão úteis no passado era uma verdadeira fonte de ansiedade. De repente, eu estava às voltas com a minha própria nudez, aberto a afirmações e rejeições, abraços e socos, sorrisos e lágrimas, tudo dependendo simplesmente de como eu era compreendido no momento.
Amizades, contatos e reputações não mais podiam ser levado em conta. Essa experiência foi, e de muitas maneiras ainda é, as mais importante experiência da minha nova vida, porque obrigou-me a redescobrir minha verdadeira identidade.
Estas pessoas arruinadas, feridas e completamente despretensiosas me forçaram a abandonar o meu ego relevante, o ego que pode realizar coisas, mostrar coisas, provar coisas e construir coisas.
Elas me forçaram a retomar aquele ego sem enfeite, que me deixa completamente vulnerável, aberto a receber e a dar amor indiferente de quaisquer realizações.
Digo isto porque estou profundamente convencido de que o líder cristão do futuro é chamado para ser completamente irrelevante e a estar neste mundo sem nada a oferecer a não ser a sua própria pessoa vulnerável.
A primeira tentação de Jesus era para ser relevante: transformar pedras em pão. Oh, quantas vezes desejei ter este poder! Ao caminhar pelo arredores de Lima, no Peru, onde crianças morrem de fome e por causa da água contaminada. Eu não seria capaz de rejeitar esse dom mágico de transformar as ruas de pedras empoeiradas em lugares onde as pessoas pudessem pegar uma pedra e descobrir que era um pãozinho
Não somos nós, líderes e ministros, chamados para ajudar as pessoas, alimentar os famintos e aliviar o sofrimento dos pobres? Jesus enfrentou essas mesmas questões. Mas, quando lhe pediram para provar o seu poder como Filho de Deus através do comportamento relevante do transformar pedras em pães, Ele se apegou a sua missão de proclamar a Palavra.
O líder do futuro será aquele que ousa afirmar a sua irrelevância no mundo contemporâneo como uma vocação divina. Ela permite que ele esteja em profunda solidariedade com a angústia atrás de todo aquele esplendor do sucesso. E leve a luz de Jesus para brilhar ali.
A Tentação de SER ESPETACULAR
Fui educado num seminário que me fez acreditar que o ministério era essencialmente um assunto individual. Eu tinha que ser bem treinado e bem formado, e depois de anos de treinamento e formação, era considerado bem equipado para pregar, administrar, aconselhar e dirigir uma igreja.
Fizeram-me sentir como um homem numa caminhada muito longa com uma enorme mochila contendo todo o necessário para ajudar as pessoas que encontrasse pelo caminho. As peguntas teriam respostas, os problemas teriam soluções e as dores teriam remédios. Era só ter certeza com qual dos três eu estava lidando.
Vivendo numa comunidade com pessoas tão feridas (deficiência mental), descobri que eu havia passado a maior parte da minha vida como trapezista, tentando caminhar nas alturas, numa corda bamba, para alcançar o outro lado, e sempre esperando por aplausos quando eu não caía.
A segunda tentação à qual Jesus foi exposto foi precisamente a tentação de fazer algo espetacular, algo que pudesse render-lhe grandes aplausos. "Atira-te do pináculo do templo e deixa que os anjos te segurem e te carreguem em seus braços". Mas Jesus recusou-se a ser um super-homem. Ele não veio para se mostrar. Ele não veio para caminhar sobre brasas incandescentes, para engolir fogo ou para colocar a sua mão na boca do leão para demonstrar o grande valor do que tinha a dizer.
Quando você olha a igreja de hoje, é fácil ver o predomínio do individualismo entre ministros e líderes.
Pode-se dizer que a maioria de nós se sente como um trapezista fracassado, que não tinha poder para atrair multidões, que não conseguia promover muitas conversões, não tinha o talento para criar belos programas, não era tão popular entre os jovens, os adultos ou os idosos como esperava, e que não era tão capaz de atender às necessidades do povo como queria.
Ao mesmo tempo, a maioria sente que deveria ter sido capaz de fazer tudo isto, e de fazê-lo com sucesso. A ambição de ser uma estrela ou herói individual, que é tão comum na nossa sociedade competitiva, também não é um sentimento estranho na igreja. Lá também a imagem dominante é aquela do homem ou mulher que conseguiu o sucesso sem a ajuda de ninguém, ou daquele que pode fazer tudo sozinho.
A Tentação de SER PODEROSO
Todos sabem qual foi a terceira tentação de Jesus. Foi a tentação do poder. "Eu te darei todos os reinos deste mundo e a sua glória", o diabo disse a Jesus.
Uma das maiores ironias da história do cristianismo é que os seus líderes constantemente caíram ante a tentação do poder - poder político, poder militar, poder econômico, ou poder moral e espiritual - muito embora continuassem a falar no nome de Jesus, que não se apegou ao seu poder divino, mas esvaziou-se a si mesmo e tornou-se como um de nós.
A tentação de considerar o poder um instrumento apto para a proclamação do Evangelho é a maior de todas. Estamos sempre ouvindo de outros, e dizendo a nós mesmos, que ter poder (desde que o usemos no serviço de Deus e em favor dos seres humanos) é uma boa coisa.
Mas era com ESTE RACIOCÍNIO que cruzadas foram realizadas; inquisições foram instituídas; índios foram escravizados; posições de grande influência foram cobiçadas; palácios episcopais, catedrais esplêndidas e opulentos seminários foram construídos; e muita manipulação de consciência foi usada.
Toda vez que vemos uma grande crise na história da igreja, notamos que a maior causa da divisão é sempre o poder exercido por aqueles que dizem ser seguidores do pobre e despojado Jesus.
O que torna a tentação do poder aparentemente tão irresistível?
Talvez porque o poder ofereça um fácil substituto para a difícil tarefa de amar...
Parece mais fácil ser Deus do que amar a Deus, mais fácil controlar as pessoas do que amá-las, mais fácil ser dono da vida do que amar a vida.
Jesus pergunta: "Você me ama?"
Nós perguntamos: "Podemos sentar à tua direita e à tua esquerda no teu reino?"
Nós perguntamos: "Podemos sentar à tua direita e à tua esquerda no teu reino?"
O autor, Henri Nouwen, compreendeu que o caminho para subir é descer. Abandonou sua brilhante carreira de professor nas melhores universidades dos EUA (Notre Dame, Yale e Harward) para compartilhar sua vida com os necessitados, servindo numa comunidade para deficientes mentais em Toronto, Canadá.